A Festa dos Rapazes em Vale de Salgueiro
Fernando Pires, jornalista da Rádio Terra Quente, tem escrito todos os anos para o Jornal de Notícias sobre a Festa dos Rapazes em Vale de Salgueiros e o presente trabalho deve-se sobretudo a ele.
A aldeia de Vale de Salgueiro, no concelho de Mirandela, tem uma forma bem original de assinalar o Dia de Reis, também chamada Festa dos Rapazes em honra de Santo Estêvão, afirmando-se uma manifestação plena de tipicismo e de enorme tradição popular.
Todos os anos, é escolhido alguém para protagonizar a figura do rei, que organiza a festa e traz consigo uma coroa carregada de ouro emprestado pelos habitantes, que vale cerca de 30 mil euros.
Mas as tradições fora do comum não se ficam por aí e dezenas de crianças andam pelas ruas com maços de tabaco e têm permissão dos próprios pais para fumar, mas só durante dois dias.
Tal como manda a tradição, a festa dura dois dias. O rei percorre todas as habitações da aldeia, sempre com o grupo de gaiteiros a acompanhar, distribuindo cerca de 300 quilos de tremoços e 100 litros de vinho, em cabaças tradicionais. Em troca, a população oferece um donativo para custear a festa.
Entretanto, no centro da aldeia, prepara-se o baile e, quando o rei chega, as pessoas são convidadas a dançar a murinheira, típica dos celtas, ao som das gaitas de foles e dos bombos.
No segundo dia, a alvorada acontece às sete da manhã. O rei, ao som das gaitas de foles e dos bombos, volta a percorrer toda a aldeia para receber a "manda", ou seja, os donativos para custear as despesas que a festa acarreta.
Não se sabe a origem
Ninguém sabe ao certo quando começou a tradição da festa de Vale do Salgueiro, nem as razões que levaram à sua realização desta forma. Os mais velhos dizem apenas que "isto já é assim desde há muitos anos, vem do tempo dos nossos avós", afirma um idoso da aldeia transmontana, já com 82 anos, acrescentando que, "na minha infância, já havia esta tradição de fumar cigarros, que custavam cinco tostões".
No entanto, sempre há alguns que contam histórias que tudo terá começado no tempo dos reis. "Alguém tirou a coroa, deixou-a no altar da igreja e acabou por morrer de imediato. Então, o povo achou que a coroa devia ser colocada sempre em alguém, para afastar os maus espíritos", conta outro habitante da aldeia.
A festa termina com a celebração da missa, ocasião aproveitada para colocar a coroa noutro habitante da aldeia, que terá a responsabilidade de organizar a festa de 2008. O escolhido foi Miguel Cunha, que já prometeu "uma festa de arromba, para que a tradição nunca termine".
Em Portugal, e sobretudo em Bragança, existem outras Festas dos Rapazes, como, por exemplo...
A Festa de Santo Estevão ou dos Rapazes em Ousilhão
Todos os anos, nos dias 24, 25 e 26 de Dezembro, o povo repete as mesmas cerimónias e os mesmos ritos. Tudo se passa, como se fosse pela primeira vez, ou como se começasse tudo de novo, in illo tempore, com a “reactualização periódica”, dos mesmos rituais. A festa é feita pelo povo e organizada pelos mordomos - quatro moços - que já ficaram incumbidos no ano anterior de realizar a festa no ano seguinte.
Quando os mordomos se eximem das suas obrigações os rapazes da aldeia fazem-lhe o enterro. Com todo o cerimonial armam um cadafalso, preparam um púlpito, os bancos e a estante para os ofícios. Preparam um “mono” - um boneco feito com palha e farrapos - e chamam os “padres” (homens trajados de padres) e os mascarados que gritam, cantam e dançam ao som da gaita-de-foles e ao mesmo tempo conduzem o cadáver (o mono) até ao cadafalso. Entoam de seguida o “ofício”. Quando este está terminado o pregador faz o elogio fúnebre - uma farsa em verso que faz rir à gargalhada os ouvintes -, de seguida lê o testamento e por fim, os elementos que participaram fazem a incineração do cadáver. Concluída a cerimónia comem e bebem até fartar. Este ritual acontece raramente, pois ninguém quer sujeitar-se a este levantamento social, mas segundo o testemunho do Senhor Alberto Esteves, de 75 anos, habitante e residente em Ousilhão e ainda elemento activo da festa, lembra-se de participar num acontecimento destes. Diz ainda o nosso informador, que nesse ano a festa não se fez e, por isso, a agricultura não deu nada, os frutos bicharam e os animais adoeceram.
Em anos anteriores, a festa era organizada pelos rapazes de um dos bairros, mas, hoje, já não importa a que bairro pertencem os organizadores, apesar de ter sofrido algumas alterações, a festa de Ousilhão, comparada com a festa das povoações vizinhas, é aquela que preserva a maior parte dos elementos tradicionais:
Tem como personagens principais um rei e dois vassais, quatro moços, um gaiteiro, um tamborileiro e um grupo de mascarados e como ritos cerimoniais a ronda - que integra o peditório e uma espécie de roubo - a todos os moradores da aldeia, contando para o efeito com a presença dos mascarados, dos quatro moços, do gaiteiro e do tamborileiro; estes, indo de casa em casa dão as boas-festas acompanhados de música, dança e recebem em troca uma oferenda; a missa celebrada ao santo e a refeição cerimonial e colectiva que integra a bênção da mesa, a transferência de poderes e o leilão da mesa.